Mesmo em guerra aberta com França, numa tentativa de a subjugar, César
ao mesmo tempo que liderava as batalhas, não deixava também de se instruir.
Este verso pode também ser para Camões o retrato de si próprio,
reconhecendo-se nele um tom autobiográfico. Para além de poeta (“pena”) e
narrador das aventuras dos marinheiros portugueses, Camões foi ao mesmo tempo
embarcadiço na viagem marítima para a Índia e guerreiro (“lança”) empenhado na
defesa da pátria pela força das armas. Como poeta, Camões usou a palavra para salvar
do esquecimento os feitos heróicos dos portugueses e garantir-lhes uma espécie
de imortalidade. (“por obras valerosas se vão da morte libertando.”) O poeta
defende que as aventuras vividas pelos marinheiros portugueses os fez rudes e
insensíveis, (apesar de fortes e robustos na guerra), completamente indiferentes
à arte de escrever, que é, segundo Camões, a única forma de salvar os heróis do
esquecimento e dar-lhes um lugar na História. Diz que se se mantivesse a
ignorância e a falta de capacidade dos embarcadiços para as letras, não haveria
“Eneias nem Aquiles”, ou seja, não haveria heróis eternamente lembrados, porque
não haveria ninguém capaz de registar os feitos dos portugueses, pelo que aos
olhos do tempo nada teria acontecido, tudo teria caído no esquecimento
completo. O poeta defende que guerreiro algum poderá ser louvado enquanto não
houver interesse pela arte que o valorize, nomeadamente por intermédio da
literatura. São os poetas que fazem os heróis; sem os poetas não poderia
existir memória dos seus feitos. Faz também o paralelismo com os heróis da
Antiguidade Clássica que para além de excelentes guerreiros eram também cultos
e instruídos. Em todas as civilizações existe a conjugação da força e da
inteligência; o poeta queixa-se que apenas em Portugal isso não se verifica.
Ora, é aqui que Luís de Camões entra e desempenha o papel de salvador
da nação, aparecendo como um fósforo aceso na escuridão, isto é, apesar de ser
também guerreiro, é diferente de todos os seus companheiros de aventura que,
pelo seu analfabetismo, seriam incapazes de registar os aspectos mais relevantes
da História de Portugal, pelo que é ele (Camões) que o faz.
João Miguel Aragão
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